A
palavra, que tem origem no latim macula, representa um sentimento de desgosto, pesar, sensação de amargura, tristeza, ressentimento.
É um
descontentamento que, embora frequentemente brando, pode deixar resquícios que
podem durar um bom tempo. Por vezes é possível percebê-lo no semblante, nas
palavras e nos gestos de uma pessoa.
Poderíamos dizer que a mágoa é uma forma de
suicídio. Viver amargurado, nostálgico pelo o que foi e não é mais. Pelo o que
foi e deixou feridas profundas. Um suicídio postergado que vai matando aos
poucos, nos envolve de tal forma que não conseguimos mais raciocinar de forma
clara a respeito que quem nos magoou, além de gerar medo ou receio de ter novas
experiências e relação. Impede o sorriso abundante, que poderia trazer o gosto
bom de viver. Impede a confiança no outro.
A mágoa é um sentimento aparentemente
insignificante, porém deixa marcas gigantescas em nossa dinâmica interna. Não é
uma doença, é apenas um sentimento gerado por formas específicas de pensar.
Raciocinar de tal forma que o leve a crer, que aquilo que o outro fez está errado,
que não deveria ter feito, que deveria ser mais sensível, pensar mais, que
deveria saber o que estava fazendo, que deveria... Todavia, não foi o que
aconteceu. O outro tomou atitudes que lhe mostraram uma realidade que
desconhecia, inesperada. E o que fazer quando a realidade nua e crua, se
apresenta em nossa porta e bate até que abramos? Não bata a porta em sua cara,
receba-a como um amigo para uma conversa.
Devemos extrair o máximo de proveito, o
máximo de aprendizagens e pensares lúcidos, devemos nos tornar amigos, assim
será mais fácil para lidar com a realidade.
Aceitar esse real não significa
deixar-se ser dominado. Que o seu sentimento de raiva ou ódio tornem-se num
rançoso sentimento de mágoa. Não. O outro apenas lhe mostrou uma realidade. Por
sua vez agora, deve analisar o que está sendo mostrado e tirar suas próprias
conclusões. Depois se faz necessário que mostres a sua escolha, frente ao que
foi apresentado. Não se trata aqui de vingança, mas sim de limites. O outro vai
até onde permitimos que vá. O outro entra em nossa vida pelas portas que
abrimos, o outro faz conosco aquilo que permitimos que faça. Podes escolher
trancar algumas portas, porque não! Podes distanciar-se, podes continuar com
reservas. Podes voltar a confiar. Cada um pode fazer a própria escolha
consciente, analisando as circunstâncias sem precisar alimentar em si, a mágoa.
Na medida em que nos
relacionamos com as pessoas, vamos apreendendo e identificando o terreno de
cada um. Percebendo onde podemos pisar ou não. Não é interessante magoar nem
ser magoado. No momento em que existe um conhecimento mútuo, é importante que
se crie um respeito mútuo, pautado no conhecimento que cada um tem do outro. Se
houverem deslizes, deve-se fazer os questionamentos necessários à elucidação do
fato. Deve-se se perguntar o que pode ser relevado, absolvido ou mesmo
condenado.
Já que a mágoa é um sentimento
gerado por uma forma específica de pensar em relação ao outro, para que ela não
se forme, precisamos pensar diferente do modelo padrão causador da mágoa.
Pensarmos de tal forma que possamos ter lucidez e entendimento com relação aos
fatos. Assim, evitamos esse corrosivo sentimento, nos sentiremos mais leves,
acabaremos por compreender mais o outro e a nós mesmos.
Extraído do Artigo publicado na Revista Psicologia Brasil de Nº 16 - Dezembro de 2004.